domingo, 6 de julho de 2014

120 horas em Lhassa - Parte X

15 horas, 40 minutos

 Uma pequena lamparina á gás, um saco de dormir e um livro que um norueguês escrevera sobre a pesca das baleias: tal era o que se encontrava na simples tenda laranja que Li montara para acampar na Praça Central.
Nunca fora tão feliz na vida. Mesmo depois de passar o dia berrando e dormir em um lugar sem qualquer luxo, estava feliz de ter quebrado a rotina e sentia que tinha contribuído em algo para a sociedade, o que a enchia de alegria.
Quando já abria o saco de dormir para deitar, ouviu uma voz vinda de fora.
-Alô. Quem está aí dentro.
-Li. Perdão, mas quem está aí fora?
Li se aproximou da porta de tela e por ela logo teve a impressão de reconhecer uma silhueta. Abri a porta. Era o monge que encontrara mais cedo.
-Ah, é você. Algum motivo especial para aparecer aqui?- disse, alegre.
-Nada não. Só gostaria de parabenizá-la pela sua ação hoje. Você... Fez muito por nós.
-Fico feliz que tenha gostado.
-Posso entrar?- disse, abruptamente.
Li hesitou. Por um lado, era um completo estranho, e convidar completos estranhos para uma tenda que ainda por cima estava perdida num mar de tendas praticamente idênticas talvez fosse má idéia. Por outro lado, pelo menos em teoria era um monge- e monges pregavam a não violência.
-Certo. Pode entrar- disse ela, fazendo um ar misterioso.
Jung sentou ao lado do saco de dormir, em frente de Li.
-Então, você é repórter, não?
-É isso aí. Tenho até minha própria equipe.
-Quem sabe amanhã então você pode nos filmar como disse.
Antes que se desse conta, percebeu que Jung estava mirando-a com os olhos e parecia que já o estava fazendo há muito tempo. Ambos ficaram se olhando, em silêncio, porém todos os seus gestos eram calculados para representar tudo aquilo que queriam dizer.
Antes que pudesse fazer qualquer coisa à respeito, Jung começara à acariciar o seu rosto lentamente, e, subitamente, a barraca, que até pouco mesmo com o aquecedor ligado estava gelada, estava agora muito mais quente, até agradável.
Antes que notassem, os dois estavam de olhos fechados e seus rostos se aproximaram até se tocarem.
-Espera- disse Li, voltando à si, deixando de lado seu jeito misterioso e convidativo- Isso não está certo. Eu... eu sou virgem.
Jung começou à rir.
-Minha filha, eu sou um monge. Não dá pra ficar mais virgem que isso. Hoje cedo o mundo foi nosso. Agora, temos apenas um ao outro.
O ritual recomeçou e seus corpos logo se tocaram mais uma vez, até que um barulho vindo de fora os interrompeu.
-Ai saco... espera... que movimentação é essa?- olhou pela porta de tela, apontando com a lanterna.
-Ei! Canal 5... Canal 1... CANAL DO ESPORTE? o que toda essa gente está fazendo aqui!?- Li olhou para Jung, confusa. -Jung! Minha cobertura! O que está acontecendo?
-Eu... eu não sei! A mídia toda está aqui?
-Aparentemente, está. Droga, Jung!
-Eu... eu não previ isso. Tem alguma coisa errada. Acho que as coisas estão saindo de nosso controle.
Li re-abotoou o terno e saiu da barraca, para o grande desapontamento de Jung.
Saco.
___

-Ei, vocês. São do Canal do Esporte, né?
Os repórteres, um grupo de pessoas bastante confusas, todas de roupão e pantufas, olharam-na de cima à baixo e responderam:
-É, é, somos.
-E... o que exatamente estão fazendo aqui?
-Não sabemos. Aquele cara... quem é mesmo?
-O Ministro da Cultura.
-Isso, ele disse para virmos para cá registrar o discurso do Dalai Lama, mas isso aqui tá mais parecendo uma manifestação.

Li desligou-se um instante.O Ministro da Cultura está conosco? Pera, temos um Ministro da Cultura? 

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